Em sua Coluna Grand Prix, também publicada no site Warm Up, o jornalista Reginaldo Leme fala sobre o episódio de racismo proporcionado por torcedores espanhóis quando Lewis Hamilton estava nas pistas daquele país.
“Rivalidade e racismo”
“Rivalidade faz bem à F-1. Mesmo com brigas em tribunais, escândalo de espionagem e punições que interferiram no resultado do campeonato, a F-1 ganhou muito com a rivalidade sem limites entre Alonso e Hamilton no ano passado. E, certamente, o fato de os dois correrem em equipes distintas daqui para frente não marcaria o fim das brigas. Nem entre os dois e nem entre a imprensa da Inglaterra e da Espanha. Ao contrário, ainda ganharia a adesão dos franceses da Renault, nova casa de Alonso, e chefiada pelo italiano Flavio Briatore, um sujeito que para entrar numa briga não precisa mais do que um pequeno estímulo. Mas rivalidade não tem nada a ver com racismo. Na rivalidade está a grande marca das diferentes épocas da F-1, como as de Emerson Fittipaldi e Jackie Stewart, Niki Lauda e James Hunt, Alan Jones e Carlos Reutemann, Nelson Piquet e Alain Prost, Piquet e Nigel Mansell, Ayrton Senna e Alain Prost, Senna e Mansell, Michael Schumacher e Jacques Villeneuve, Schumacher e Juan Pablo Montoya. Estou falando só dos casos mais explosivos e, não necessariamente, com disputa de título. Damon Hill disputou título com Schumacher, mas não foi exatamente um rival. Montoya nunca disputou título, mas foi trazido para a F-1 para ser rival de Schumacher e incorporou a missão. Nada a ver com o racismo imperdoável do torcedor espanhol, que não vaiou Hamilton como o torcedor brasileiro vaiava Prost na época de Senna. Ele xingou Hamilton como os torcedores do Barcelona xingavam o lateral Roberto Carlos nos jogos contra o Real Madrid. Ser negro é uma característica pessoal de Hamilton entre muitas outras, inclusive a de ser um piloto excepcional que, mesmo como estreante do ano, superou e desequilibrou o bicampeão Alonso, que tinha derrotado Schumacher nos dois anos anteriores. Esta é uma verdade histórica que o despeitado preconceito daqueles torcedores não vai apagar. Claro que a generalização também é perigosa. Houve quem vaiou, mas também quem tirou foto e pediu autógrafo para Hamilton. Ainda que não acredite no relato feito pela direção do autódromo, de que a atitude racista partiu de um pequeno grupo de dez pessoas com um megafone, esses caras foram expulsos do autódromo e a imprensa espanhola considerou “um espetáculo vergonhoso para a Espanha”. Isso e mais a justa ameaça da FIA de cancelar os dois GPs desse ano em território espanhol (Barcelona e Valência) seriam suficiente para uma trégua. Mas os ingleses, com sentimentos igualmente racistas, como os que eles demonstram quando vêm para o Brasil ou vão para a Espanha e, mesmo, a Itália, querem guerra quando dizem que “o racismo é o esporte espanhol” (Daily Telegraph).No ano passado, antes mesmo de começarem as desavenças com Alonso, Lewis Hamilton lembrou que foi na Espanha que ele sempre passou as férias escolares, em companhia dos pais. E numa delas, quando tinha seis anos de idade, dirigiu pela primeira vez um kart de aluguel. No meio do ano passado, quando se mudou para a Suíça para fugir dos pesados impostos ingleses, conta-se que ele chegou a pensar em morar no litoral espanhol, onde muitos ingleses têm residências de verão, inclusive Jô Ramirez, ex-funcionário aposentado da McLaren, que lhe fez algumas indicações. Foi convencido a não fazer isso, mas não se convenceu de que todos os espanhóis são Alonsos”.